Artigo – ‘Vou deserdar você, espera para ver’!!! – Ana Lúcia Moure Simão Cury
Realmente a deserdação, presente as hipóteses legais, pode ser uma surpresa para o herdeiro.
As hipóteses estão previstas em lei e são taxativas, não admitindo, portanto, interpretação extensiv (Reprodução)
A deserdação é uma palavra corriqueira no senso comum. Brinca-se daqui e dali, “olha lá, pensa bem, porque eu deserdo você”. Realmente a deserdação, presente as hipóteses legais, pode ser uma surpresa para o herdeiro. Tome-se como exemplo, simples agressões físicas que, ainda que leves, podem ser motivos de deserdação.
Mas a deserdação não é imediata. O ofendido deve declarar os atos que sofreu em uma escritura de testamento, que nada mais é que a disposição de última vontade do testador.
Escolhida a forma de testamento, sendo a mais segura a forma pública, o testador comparece ao Cartório de Notas, sob orientação de advogado de confiança, e na presença de duas testemunhas declara a sua intenção pós mortem.
Nesta escritura o testador deve declarar, de forma clara e precisa quais os atos que, por exemplo, o filho praticou em seu desfavor.
As hipóteses estão previstas em lei e são taxativas, não admitindo, portanto, interpretação extensiva.
Com a abertura do testamento, os interessados, que podem ser os demais filhos do próprio finado, tem prazo de 4 anos para ajuizar a ação de deserdação, provando que os fatos narrados pelo testador, agora falecido, realmente ocorreram.
Julgada procedente a ação, caracteriza-se o que o direito denomina de morte civil, como se aquele herdeiro não existe para fins de sucessão. Se este herdeiro deserdado tiver filhos, netos do testador, a herança será transmitida para os mesmos, já que a pena pelo cometimento dos atos que conduziram a deserdação não pode ultrapassar a pessoa do ofensor, nos termos do comando inserto no artigo 5º., XLV da Constituição Federal.
Assim é que o testamento é a forma para que o ofendido declare e descreva, com detalhes, o ato praticado pelo ofensor, visando que este último não receba a herança por ele deixada após a sua morte.
A situação também poderá ser inversa, vejamos um filho, solteiro e sem descendentes, tendo como herdeiro legítimo o seu próprio pai. Da mesma forma, havendo qualquer ato caracterizador de deserdação, poderá este filho manifestar, em testamento, os atos que conduzem a deserdação de seu próprio genitor.
O prazo de quatro anos para o ajuizamento da ação de deserdação se inicia com a abertura do testamento deixado pelo finado. Julgada procedente referida ação, resultará no afastamento do ofensor da sucessão, caracterizada o que chamamos de morte civil, como se o herdeiro não existisse.
Sem dúvida, a deserdação é uma resposta ao ofensor que tendo direito a herança, praticou ato violento contra o autor da herança, sendo incompatível seja o mesmo beneficiado com patrimônio deixado pelo de cujus.
Premiar com herança, premiar com patrimônio, aquele que não conferiu ao pai ou ao filho, o devido respeito, afeto, amparo material e atualmente considerado por parte da doutrina, até o amparo afetivo, seria um contrassenso.
Então, a surpresa da deserdação poderá surgir a este ofensor, tão logo ocorra o falecimento do testador, que de lá assistirá também a chamada morte civil deste herdeiro. O herdeiro estará aqui vivinho da silva, mas para efeito da herança será considerado tão morto como o próprio testador.
Por Ana Lúcia Moure Simão Cury
Fonte: A Tribuna